
BEIRE - Flash's
Aquele «presente» já prometido
1. Fitas para os «comungantes»… No número anterior d'O Gaiato, falei-vos da sms que, na Quinta Feira Santa (Ceia do Senhor), enviei para os meus familiares mais chegados — os de sangue e coração. E também para os «só de coração». Porque, se gosto de cultivar os 'laços de sangue', não gosto menos de cuidar os 'laços de coração'. Esses que, mesmo demorando muito tempo a tecer bem, podem romper-se num triste de repente em que a cegueira emocional subiu ao poder e deu cabo de tudo… Sem se dar conta de que o amor é como o café — requentado já não presta…
A coisa foi assim: Entre esses «familiares de coração», tenho alguns antigos gaiatos(1) com quem tive o privilégio de conviver — uns ainda vivos e outros a quem «o Senhor já chamou a Si»… De um desses, a quem estimo muito, pela trajetória que na Casa do Gaiato fizemos juntos, recebi esta sms — eco daquele meu que já partilhei:
«E pensas bem porque felizmente, como tu, tb sou do tempo em que nos habituamos a celebrar o dia com tudo o que ele significa principalmente como instituição da Divina Eucaristia, costumo dizer a forma divina que Jesus "inventou" para ficar connosco e a forma humana de ser alimento e presença. Era de tal forma que se faziam as primeiras comunhões e as comunhões solenes e eu pintava a óleo lindas fitas para os comungantes levarem nos braços.
Hoje vivencio o dia com todo o seu significado espiritual. Por isso participei na nossa igreja na cerimónia de 5a. feira Santa com uma das minhas filhas.
Não te respondi mais cedo porque exatamente essa minha filha fez 58 anos e estivemos todos a celebrar o seu aniversário. (…) É nesta fé que comungo contigo este dia e amanhã (cerimónia e via sacra), e depois a Ressurreição. Que explosão !!!».
Cada um que leia como quiser. Sinto-me habitado por mil razões para acreditar que a Obra da Rua, que já deu tais filhos à Pátria, pode e deve continuar a ser uma «palavra nova — porque tirada do Evangelho». Sei que isso, hoje, pressupõe uma «sinodalidade» para que as novas Direções — da Obra e da Segurança Social — (com suas novas exigências) ainda precisam de tempo para se prepararem. Aprenderem a dia+logar(2) com a nova realidade social que já campeia — quer a nível de «cultura religiosa» quer a nível de «cultura profana»… Que já não é nada a de 1940/1950. Não é, mas ainda precisa de muitas respostas sociais novas e válidas. Res+postas sociais que, «ou são também respostas 'teologais'», ou já não são nada, porque não passam de fachadas para politica fazer…
2. Um livro que ficou «debaixo do alqueire»… No desenrolar desta sms, lembro a morte do nosso Carlos Trindade, que foi glória da Casa do Gaiato de Miranda. Ainda com Pe. Horácio ao leme. Sei que, na altura, até escrevi uma crónica (20.02.2016) a partilhar coisas que a morte dele acordou em mim. Impelido também pelas significativas achegas do nosso Nana. Que sempre me dizia querer «ir à campa do Snr. Professor, em Miranda». E fomos. Estou a ver o Nana a homenagear a memória daquele antigo gaiato, seu professor. Que tanto ajudou a Obra da Rua a formar mais «portugueses de lei», no castiço dizer de Pai Américo. «Tirar os rapazes da 'escola do crime', que a rua sempre é, para fazer deles portugueses de lei». Com o acrescento de que «um só que fosse, já a Obra valia a pena. Mas eles são tantos!... Tantos!...».
De conversa em conversa, soube que, a pedido dos seus familiares — «para deixar aos netos» — o Carlos Manuel (também assim chamado) chegou a escrever aquilo que já não chegou a publicar porque «a doença não perdoa e…». Já tenho aqui na frente o que ficou e a família guardou «para familiares e amigos». Agora com um artístico arranjo de capa ilustrado pelo prefaciador e autor da sms supracitado — o Dr. Carlos Alberto de Jesus.
Saboreio o título: Vocação, que é do Carlos Manuel e o subtítulo, que o Jesus propõe: Um filho de Pai Américo na continuação da sua Obra. Paro-me a ruminar as seis páginas do prefácio, bem tecido para ser dado à estampa. É também de um antigo gaiato — amigo, condiscípulo e «companheiro de luta» na sua entrega à Obra — por «vocação divina»(3)…
Ouço vozes cá dentro… Preciso arranjar formas e tempo para dar a conhecer aos amigos da Obra estas pérolas que, à custa de muito trabalho e dor, nela se foram criando. A Obra, porque «Deus a quer», não é de ontem. É de hoje e de enquanto o nosso mundo dela precisar.
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1 — Sei e gosto de saber que alguns gaiatos não gostam da expressão «antigos gaiatos» porque acham, e com razão, que «gaiato uma vez, gaiato para toda a vida". Como se, na linguagem da doutrina do antigamente, o ser «gaiato» imprimisse «caracter»... É bonito sentir isto. Também eu gosto de me sentir «marcado» pel'O Gaiato — a quem tanto devo do que vou tentando ser…
2 — Não me canso de ruminar a palavra diálogo. Ela me fala do «logos» como «Palavra Eterna» que quer montar Sua tenda no meio de nós — para unir aquilo que, sento múltiplo, não pode deixar de ser uno, sob pena de desaparecer… César não pode viver sem Deus nem Deus é Criador sem as Sua criaturas. «Nenhum poder terias se te não fosse dado…» (Jo… ).
3 — Encanto-me como tema «vocação». Acho que é sempre um curioso «fenómeno humano» em que o «fenómeno divino» se faz sentir mais — porque «feitos da mesma massa»…
Um admirador
[Escreve segundo o acordo ortográfico]