BENGUELA - VINDE VER!
De regresso a Casa
As viagens quase sempre nos desafiam a experimentar o quanto custa estar longe do contexto laboral em que estamos acostumados no desempenho da nossa missão. Ainda bem que somos uma Obra Missionária, que há sessenta anos foi enviada a ser uma palavra nova na mais sublime expressão da caridade evangélica nas terras do além-mar. Refiro-me à chegada dos fundadores em travessia feita ainda de barco até Angola e depois até Moçambique, enquanto aguarda a hora alta para ser outra vez uma palavra nova em outras paragens do nosso país e pelo mundo fora. Continuamos a receber diariamente muitas solicitações para acolher rapazes em nossa Casa. A situação em que vivem milhares de famílias angolanas acaba por levar a exposição da criança num estado avançado de vulnerabilidade. A carência de recursos para aquisição dos bens de primeira necessidade, o fraco poder de compra face a exagerada subida dos alimentos, tem levado à mendicidade obrigatória muitos meninos e meninas a percorrer as ruas da cidade, em busca de uma solução para a sobrevivência. Ao menos para acender uma pequena luz no fundo do túnel da miséria forçada pelas injustiças sociais, e pela incapacidade de gestão das riquezas que a todos pertencem. As nossas Casas de Angola vivem neste contexto, e com escassos recursos fazem tudo que seja possível para dar respostas às inúmeras preocupações e aflições das crianças carenciadas. Certamente, Pão e Amor! As nossas crianças são o futuro desta Nação. Sem pão e sem amor o futuro fica completamente comprometido.
Da minha viagem até Portugal deixei a Casa ao cuidado dos rapazes, fazendo valer a nossa divisa. Obra de rapazes, para rapazes, pelos rapazes. Cuidar do que é seu, eis a consciência que queremos todos ter sobre a nossa vida em família. Cuida da família que cuidas de ti! Se o rapaz chega a adquirir esta mentalidade então está feito para assumir responsabilidades grandes na nossa Casa.
No domingo tivemos reunião de chefes, falei à luz de um dos textos do "Cantinho dos Rapazes", sobre a importância que tem a colaboração de todos os rapazes nas diversas tarefas da vida da Casa. "quem não vive para servir, não serve para viver". E viver em comunidade é necessário a consciência sobre o todo, sobre o que é comunitário. Sobre o que é nosso.
Encontrei todos de boa saúde, e bem dispostos cada um na sua responsabilidade. Encontrei mais dois novos filhos que foram acolhidos na minha ausência. Dois irmãos, o «Anselmo e o Man-Lau» que são irmãos de dois que já estavam connosco o «Justo e o Zaley» estavam com a mãe em Luanda e recebemos a notícia da sua morte. Foi entrada automática. Só tinham a mãe e mais ninguém. Estão felizes e quando cheguei pediram-me os doces de Portugal, e os tinha na mala. Foram oferecidos pela «Preciosa» de Paço de Sousa. Foi uma chegada Feliz embora com o pivô avariado e outras máquinas que por algum descuido e falta de experiência dos rapazes se estragaram, mas é dando oportunidades de crescimento e maturidade que se fazem homens autónomos do amanhã. A conclusão é de Pai Américo "Os homens que constroem para a Eternidade empregam, acima de tudo, grandes remédios nos grandes males e o resto virá a seu tempo. No caso presente o grande remédio é escolher dos mais pobres entre os Pobres; dos mais enxovalhados entre os sujos; dos mais desprezíveis entre os desprezados. É levar de entre doentes os de maior gravidade, de entre famintos os que passam mais fome e os de mais vícios entre os viciados. Aplicar o remédio conforme o doente e na medida das feridas de cada um; cuidar de todos eles com intenção muito recta e muito silenciosa; esperar que o calhau venha de cima, abrir brechas fundas no coração daqueles que avidamente procuram a Sopa nas traseiras do jornal - e mais nada".
Padre Quim