CALVÁRIO

Quem quiser ganhar a Vida tem de perder a vida!

Padre Américo, Pão dos Pobres, vol. 3, p. 218.

O que fazemos aos pobres por amor a Cristo, é o que levamos conosco quando morremos.

Peter Maurin (1877-1949) co-fundador do Movimento Operário Católico

O IV Domingo da Páscoa é ilustrado com a imagem do bom pastor. A pastoral vocacional da Igreja universal associa a essa evocação uma jornada de oração pelas vocações à vida sacerdotal. Por isso não é descabido ler a vida sacerdotal como uma actividade pastoril. Vida simples, obediente, dedicada, atenta às necessidades dos outros. Vida culta e simultaneamente oculta, porque itinerante, não desacomodada e despojada de títulos e propriedades.

No antigo testamento sempre lutaram os pastores e os agricultores: Caim contra Abel, assassinado; os filhos de Jacob contra o seu irmão José, vendido para o Egipto. No novo testamento, apesar de Jesus ter aprendido a arte de carpinteiro, identificou-se com o pastor, com aqueles que, quando veio ao mundo, o visitaram e acolheram em primeiríssimo lugar.

Jesus sabe, como diz John L. Mckenzie (Dicionário Bíblico, Paulus), que no antigo médio oriente o título de pastor era aplicado a reis e a deuses. Jesus recitou o salmo que o seu antepassado David compôs em louvor do Senhor, pastor que lhe dá descanso e alimento, apesar dos seus erros. Por isso, junta à sua opção livre pelos pobres essa nuance de ser aquele que lhes indica um caminho. No evangelho de João afirma-se como a porta por onde hão-de passar todas as ovelhas e todos os cordeiros do seu rebanho (10,7) e, ainda, que dará a vida por todos (10,11). Vida salva, vida abundante. O evangelista conclui que houve divisão entre os que ouviram Jesus (10,19). Que delirava. O que terá pensado Jesus do que pensavam dele? Deve ter chorado!

Jesus é o Messias, o pastor prometido por Deus pela boca de Jeremias (3,15) e de Ezequiel (34,23), desde os tempos conturbados dos séculos em que viveram: eu vos darei pastores segundo o meu coração que farão de todos uma única nação. Alusões ao cisma de Israel e ao exílio. Lições sobre a realidade vivida e não reflectida por quem andava distraído com o poder e sobretudo com a falta dele.

Jesus é o bom pastor, o único e verdadeiro pastor porque se faz alimento, não busca comida longe e que seja perecível. Ele dá-se como alimento, comida verdadeira. É a bondade de Jesus para com cada um de nós. Um pastor que é simultaneamente pasto. O Pastor bom que se converte em Cordeiro manso para ser imolado e entregue.

O presbítero da igreja católica de hoje é um homem que carrega em si esses pesos do passado e do presente. A fidelidade à tradição não impede um compromisso com o presente e, sobretudo, uma visão de futuro. A sugestão de um trabalho pastoril faz caminhar, apesar das resistências e submissões, aqueles que se queiram envolver com projectos de uma nova criação: mais humana, mais natural, mais comprometida com quem perdeu ligações com o real. O presbítero de hoje deve ser capaz de realizar o projeto da Laudato Si exposto pelo Papa Francisco. Em comunhão com os outros ordenados, em ligação com todos os baptizados, com grande espírito de serviço a aprendendo a trabalhar em equipa. Só assim será uma pessoa de cultura universal capaz de acolher os feridos e buscar quem esteja fora de todos os círculos de humanização.

Padre José Alfredo