CALVÁRIO
O Calvário é uma lição. Não de um único mestre, mas de muitos. Os doentes. As suas necessidades, os seus pedidos e as suas manias ensinam-nos o valor do serviço a quem aparentemente já não serve a sociedade. Isso retira-lhes a dignidade e o valor? Não creio!
No Calvário há trabalho e há colaboradores. E há um plano divino onde cada um, também quem serve livremente, procura encaixar a sua existência. É sempre necessária atenção: à alimentação, à roupa, à higiene pessoal e dos espaços, à limpeza dos caminhos, às visitas amigas e da família, ao frio e ao sol, ao tempo na cadeira e ao passeio necessário, aos colaboradores, aos voluntários, aos amigos, aos desconhecidos, a todos! Ao passado e ao presente! Atenção em tensão permanente! Ao dever e à justiça. Ao íntimo e ao acessório. Como é fácil cair em extremos!
A lição de cuidar é fundamental para que esta casa-família funcione como todas as casas das famílias do mundo. Atenção a cada dia e a cada pessoa. Que evolui, que tem novos desafios, que reclama sempre mais cuidado. Atenção ao dia-a-dia. Há programas, há projectos, há procedimentos e há o inesperado! Que é preciso atender e cuidar. Sem desesperar.
Há um momento em que parece que não conseguimos mais, que tudo parece demasiado, baralhado, que todos queremos o melhor e isso não vem precipitado pelo momento. O Calvário não é um estalar de dedos e a salvação acontece. Não é um bater as mãos de modo mágico e a doença foge! O Calvário é um afagar rostos visíveis e corações invisíveis. É dialogar com histórias nunca narradas completamente.
Que fazer então? Cuidar de si mesmo impõe-se como regra fundamental para cuidar dos outros. Não permitir que desejos egoístas e ensombrados tirem tempo e paz para o cuidado dos que não se podem cuidar.
O Calvário é uma lição de comunhão com Deus, consigo mesmo, com os doentes, com os outros e com a natureza. Não é um laboratório onde experimento a caridade metodologicamente para me sentir realizado. É a própria caridade a envolver-nos e dizer-nos o quanto somos valiosos aos olhos de Deus e aos olhos uns dos outros, apesar das diferenças, das intenções, dos amores e dos humores. Apesar do tempo pesar e ser necessário tomar opções fundamentais, sem as quais pequenas atitudes diárias são lanças no nosso peito e no peito dos doentes. Como a lança do soldado a penetrar no lado de Jesus... era para aliviar, mas trouxe o fim! No fim Jesus é o Mestre de quem devemos aprender a viver a Vida que só ele soube viver e entregar livremente.
Para nós ainda nem tudo está consumado. E a última lição é aprender a confiar nos que nos permitem entrar dentro das suas existências. Sem nos apropriarmos deles!
Padre José Alfredo