CALVÁRIO

Ele (Padre Américo) nunca teve ideias predefinidas, nem projectos de secretária; ele era, de facto, um homem de respostas à intuição. O Calvário nasceu do seguinte: havia ali em Fonte Arcada uma mãe que tinha cinco filhos, todos com problemas mentais, alguns mesmo com problemas profundos. E ele, diante daquela mãe que vinha pedir-lhe ajuda para os filhos, começou a pensar: «Quem me dera ter uma casa para eles!» E foi a partir dali que ele começou a falar de uma casa para doentes incuráveis. p.29

O Calvário é apenas a casa de família para aqueles que a não têm nas circunstâncias dramáticas de abandono e de doença. p. 48

À volta de Padre Baptista,

entrevista por Henrique M. Pereira.

Modo de Ler, 2017

Não há calvário sem ferimentos. O de Beire continua ferido. As obras em curso, alguns doentes fora com perspectiva de regressarem, tantas urgências e necessidades que cruzam o portão, tantos pedidos para atendermos pessoalmente. O trabalho do Padre Baptista e de uma multidão de voluntários e pessoal de saúde no passado distante e recente nem sempre acarinhado por quem de direito. Tantos amigos ausentes. Tantos equívocos de maledicência, tantas condenações na praça pública. Tantas obrigações sem atender à intuição fundacional. Tantos desafios que a sociedade agora coloca. E bem. Neste momento concreto o maior é o de harmonizar o espírito do Calvário com a legislação em vigor para quem acolhe doentes por motivos físicos, psíquicos ou de idade. Respostas sociais e Evangelho! Poderão juntar-se por um vínculo sacramental ou apenas por uma união de facto?

É urgente reflectir e propor a quem nos rege o modo de ser Calvário. Primeiro. Propor com a verdade de quem escuta e de quem tem uma experiência a transmitir sobre o que pode ser uma casa familiar onde os doentes possam sentir-se verdadeiramente integrados e parte do ritmo da vida que aqui se desenrola. Segundo. Acolher as necessárias ajudas técnicas — assistência social, enfermagem, médica (medicina geral, psiquiatria), serviços de supervisão do estado e outras — em ordem a melhorar esse ambiente familiar e natural. Terceiro. Integrar no trabalho em equipa alargada para o Calvário, onde voluntários tenham um papel humanizador e evangélico, de acompanhamento permanente aos doentes, percebendo-lhes e apoiando as suas necessidades mais específicas. Os doentes são uma história concreta que eles verbalizam sempre. Têm de ter também quem os escute. Quarto. Criar novos ciclos de acolhimento para tantas pessoas feridas: pessoa com vulnerabilidade e seu familiar cuidador informal; vítimas de violência doméstica e separações conflituosas; crianças rejeitadas nos processos de adoção; vítimas de abusos vários (sexual, bulling, trabalho infantil). Ciclos que revitalizem a, agora, desabitada Casa do Gaiato de Beire e outros espaços edificados. Quinto. Propor o ministério sacerdotal do Padre Américo e dos padres da Obra da Rua como edifício espiritual e caminho vocacional para este mundo do fim dos tempos (como escreveu Olivier Messiaen nos anos 40).

Nesse sentido vimos propor aos nossos leitores, amigos e voluntários um ciclo de conferências intitulado O AMOR À POBREZA e que terá lugar a 27 de maio de 2023 no Auditório da Casa da Cultura de Paredes — Palacete da Granja (Av. da República 207, 4580-193). Vamos procurar ler o Calvário, passado e presente, como uma resposta concreta às múltiplas pobrezas do pretérito mais-que-perfeito e do presente do indicativo e fazer essa leitura através de várias lentes: a da SAGRADA ESCRITURA, pelo Padre LUÍS CASTRO, da Sociedade Missionário da Boa Nova e da Faculdade de Teologia — Porto; a da LITURGIA e ESPIRITUALIDADE, pelo Padre JOAQUIM FÉLIX, do Seminário Maior e da Faculdade de Teologia — Braga; a da LITERATURA do PADRE AMÉRICO, pelo Doutor LUÍS LEAL, do Centro de Estudos de História Religiosa da Universidade Católica Portuguesa — Porto; a da LITERATURA do PADRE BAPTISTA, pelo Professor LUÍS CARLOS AMARAL, da Faculdade de Letras — Porto; a da ECONOMIA, pelo Doutor AMÉRICO MENDES, da Faculdade de Economia da Universidade Católica Portuguesa — Porto.

A lotação do espaço é de 70 lugares. Os interessados devem fazer a sua inscrição por email ou por telefone: pe.alfredo@gmail.com; 911 835 876; 255 776 178. Será o dia todo e tentaremos encontrar uma forma de servir uma refeição ligeira ao almoço. Cada uma fará a oferta que entender para os custos com a organização.

Padre José Alfredo