Conferência de Paço de Sousa
HISTÓRIAS DE VIDA DO PAÍS QUE NÃO APARECEM NAS NOTÍCIAS - Hoje apetece-me falar da D. Maria (nome fictício). Com as más notícias todas que têm enchido os meios de comunicação social, hoje apetece-me falar de histórias de vida do país que não aparece nas notícias. São histórias de vidas difíceis de quem luta para vencer essas dificuldades, procurando viver com dignidade e honestidade.
Esta D. Maria de quem vou aqui falar é do Sul do país, onde trabalhou durante 11 anos numa empresa de serviços de limpeza. O patrão da empresa foi condenado a uma pena de prisão pesada, tendo deixado os seus trabalhadores no desemprego e com salários por pagar.
A D. Maria ficou, assim, desempregada, tendo vindo viver para o Norte, não sei se só por causa disso, ou também por outras razões. Talvez isso tenha sido uma forma de procurar uma vida nova e melhor depois do que, tudo indica, ter sido uma vida difícil.
No tempo em que esteve no Sul viveu com uma pessoa com quem não teve filhos, tendo ficado convencida que nunca os poderia vir a ter.
Agora, cá no Norte, está a viver com uma pessoa que já não deve ser a mesma, tendo ficado a saber, há umas semanas atrás, que estava grávida de 3 meses.
Como estava sem trabalho, colocou um anúncio num site na internet, oferecendo-se para fazer serviços de limpeza por um preço abaixo do que vigora por aí para este tipo de serviços.
Disse-nos que o preço era esse porque tem 40 anos e porque no anúncio não dizia sobre a sua gravidez.
Uma organização que estava à procura de uma pessoa para serviços de limpeza recrutou-a, mesmo depois de saber da sua gravidez. A combinação inicial foi para o preço que a D. Maria indicou no anúncio, mas sei que essa organização vai fazer-lhe a surpresa de lhe pagar acima desse valor quando chegar a hora do primeiro pagamento de salário na data que está aprazada para isso.
Há dias a D. Maria faltou ao serviço de forma inesperada. Quando se chegou ao contacto com ela para se saber o que lhe tinha acontecido, disse que estava no hospital para onde tinha ido de urgência por causa de um aborto espontâneo.
Logo na manhã seguinte ao dia em que teve alta a D. Maria veio pedir desculpa por ter faltado e veio dizer que viria fazer limpeza, na parte da tarde, à hora do costume. Disseram-lhe para ficar em casa a repousar porque estava visivelmente combalida, mas, à hora do costume, a D. Maria lá estava no seu posto, a fazer o seu trabalho.
Se em
todas as profissões e organizações houvesse mais D. Marias como esta, o país e
o mundo estariam bem melhor e haveria menos pessoas a baterem à porta das
nossas Conferências Vicentinas. A D. Maria não pedinchou nada. Deu a conhecer
as suas competências. Alguém as aproveitou, mas sem a explorar na situação
vulnerável em que ela se encontra. A D. Maria sentiu isso e tem procurado dar o
seu melhor. De empregadores e de trabalhadores assim fala-se pouco, mas é deste
género de pessoas que se faz o melhor que o país tem.
Américo Mendes