DA NOSSA VIDA

O valor maior

Causa-nos alguma perplexidade a onda de crimes contra a vida humana que assola as sociedades ocidentais, embora não seja de todo para espantar que ela esteja a atingir tais proporções. Provavelmente, por idênticas razões, não evitamos na nossa sociedade os efeitos desta onda.

Se o resultado é a desvalorização da vida humana, na sua origem deverá estar a falta de respeito por ela. De facto, logo no início da gestação do ser humano tal se verifica. Nos primeiros tempos da gestação do novo ser humano, aqueles que o geraram, sentem e têm poder ilimitado sobre ele, a ponto de poderem decidir sobre a continuação do seu desenvolvimento ou o terminar com a sua existência.

A ambiência do sagrado que envolve a vida humana, nem sequer é equacionada, perdendo-se um poderoso e importante factor no pesar do valor da vida. Chega-se ao ponto de dar mais valor a um animal que a uma pessoa humana. Assim se invertem os valores e se abre o campo à irracionalidade, onde encaixa a onda criminosa de que se vem falando.

Especialmente, os mais novos, estão mais sujeitos a ela. Eles que precisam de modelos e exemplos que interiorizem o valor da vida; eles que ainda não atingiram a maturidade humana e não experimentaram a autonomia de vida com a dureza que lhe é própria e que contribui para desenvolver a capacidade de superação das dificuldades; eles que precisam de ajuda para que os seus sentidos e sentimentos se orientem para defender a vida… estão mais indefesos e, por isso, vêm aparecendo como os menos preparados para viver em sociedade, com as consequências que se conhecem.

Se esta onda revela uma falta de consciência perante aquilo que verdadeiramente vale, a vida humana e as condições em que é vivida, piora ainda se as pessoas consomem produtos que aumentam essa falta de consciência.

Completamente ao contrário deste sentido da vida, é o da pedagogia da Casa do Gaiato, em que a presença da natureza no quotidiano entra na alma dos nossos rapazes, criando sentimentos de admiração e simpatia. O contacto com a natureza sensibiliza para o respeito pelo outro, seja igual ou não por natureza, nasce e cresce pela experiência de relação. De pouco servirão frases feitas e bem estudadas para alcançarem esses valores se não forem assimiladas na experiência da relação de vida.

Pai Américo apontava para os rapazes mais repelentes e mais viciosos, como aqueles para quem a Obra da Rua era. Aqueles que precisavam de fazer uma viragem de 180 graus na sua vida, aprendendo o respeito por si e pelos outros. Na Casa, tinham os meios mais sérios para a mudança: vida longe das ruas; justiça e verdade na vida de relação com os outros; oportunidades de autodeterminação; pertença a uma família e a uma comunidade; liberdade para fazer o bem ou o mal e a responsabilização para se confrontarem com os seus actos.

Hoje a realidade é bem diferente, mas continua a ser necessária uma pedagogia que salve, orientando para os verdadeiros valores.

Padre Júlio