DA NOSSA VIDA

Materialismo

Tenho de partilhar com os nossos amigos leitores uma palavra acerca do assunto com que encerrei o texto do nosso último jornal.

Tratava-se de um pedido de ajuda, em que uma senhora, do outro lado da "linha", se apresentava como uma mãe de uma criança pequena, a um passo de perder a sua habitação pelo despejo de que iria ser alvo no final do mês que corria.

A forma como se apresentou foi convincente. Apesar disso, pedi-lhe que me enviasse os documentos que possuía, que atestavam a situação que me expusera. Depois, porque vivia longe, iria entrar em contacto com ela uma pessoa amiga, disponível colaboradora.

O certo é que nunca mais me disse nada, apesar de eu lhe ter tentado ligar.

Uma das nossas maiores preocupações, quando nos apresentam dificuldades e percalços na vida, é constatarmos a veracidade dessas mesmas dificuldades e percalços, para que seja uma graça de Deus o que levaremos às suas mãos. Temos de agir com a pedagogia divina, que escuta quem insiste no pedido, mas é preciso bater à porta e até, por vezes, forçar a graça na obtenção dos Seus dons, como fez aquela mulher que, vindo por detrás de Jesus, sem nada pedir, lhe tocou no seu manto e obteve a cura da doença que a levara à penúria. Fora um desejo legítimo que a impulsionara. E porque acreditou alcançou.

Como uma andorinha não faz a Primavera, também um caso no mínimo duvidoso, como o que acima apresentamos, não anula a realidade de tantas pessoas que se vêem metidas num buraco de onde não conseguem sair por não terem meios para tal. Foi o caso de uma família que nos procurou, que conhecemos há já muitos anos, e que agora se vê nessa situação, de não conseguirem pôr as contas domésticas em dia. Já não é a primeira vez que batem à nossa porta, mas desta vez não dissemos logo que sim.

Nós sabemos que, por vezes, poderiam ter gerido os seus bens com maior prudência e sobriedade, com critérios mais realistas. Quem viveu os tempos antes da imposição do marketing e da profusão da publicidade tem outra visão para orientar a sua vida, com equilíbrio, o que lhe dá ferramentas para se manter no arame da vida sem cair e até para, nalguns casos, dar a mão a outros que precisam. Tal como aquela viúva que Jesus enaltece, que generosamente deu o seu óbolo, mesmo sendo tudo o que tinha para viver.

Os membros da citada família não conheceram esse tempo, e tantos que estão na mesma situação. Desperdiçam o que lhes virá a fazer falta, sem disso terem consciência, embrulhados e anestesiados no materialismo que domina, ao que o ditado popular conclui com sabedoria: «O pouco com Deus é muito e o muito sem Deus é nada».

Padre Júlio