DA NOSSA VIDA

A lei

Perante testemunhos de vida fortes, quando se é desconhecedor dessa realidade de vida, é-se invadido por um sentimento de incompreensão para o qual não se encontra saída. Assim sucedeu com Pilatos perante a afirmação de Jesus de que «todo aquele que é da verdade ouve a Minha voz.» Focado no centro da afirmação, Pilatos perguntou: «Que é a verdade?» Se ele fosse da verdade escutaria Jesus, confirmada no Seu testemunho de vida e obras. Não sendo da verdade não escuta Jesus nem a Ele adere e, embora nada encontrando n'Ele de condenável, permite a sua condenação.

Certo é que Pilatos era livre de aderir ou não a Jesus. Ser ou não da verdade de que Jesus fala, não era exclusivo da sua vontade. Tendo o poder decisivo sobre a sentença a aplicar a Jesus, deveria aplicar a absolvição porque nada encontrara n'Ele de condenável. Apesar disso não o fez, e condenou Jesus.

Há de facto muitas situações na vida das pessoas que escapam ao sentir comum dos outros e até daqueles que julgam. Muitas vezes a lei dos homens não se compatibiliza com o pensamento de Deus, que se espelha na vida e obras de Jesus e na daqueles que são d'Ele. Ou seja, não se compatibiliza com a verdade presente em Jesus, e, assim sendo, não a contempla nos seus veredictos.

A verdade contempla o bem supremo do homem. Na verdade, não se encontra o que quer que seja que vá contra o bem do homem. Mas a verdade também não é imediatista - tem em conta o bem maior do homem que é a vida, e não só a temporal, mas a eterna. Por isso, pode acontecer que o bem de uma pessoa num dado momento possa consistir em algo que a penalize, em algo que a obrigue a um esforço maior para alcançar o seu bem... É esta a condição do ser humano, num crescimento que se desenrola por escolhas, por vezes pouco claras, afirmando as suas opções que determinarão o seu futuro. Onde o padrão de referência? Na verdade, que leva a escutar Jesus e a segui-Lo.

Contrariamente a Pilatos, aqueles homens, que estavam prontos a executar o castigo sobre aquela mulher adúltera, de acordo com as suas leis, eram afinal da verdade. Tanto assim, que colocaram acima delas a verdade que os conduzia interiormente e, por isso, não as aplicaram naquela mulher, recuando na sua prevista condenação.

De todos estes acontecimentos, sai claro que um ajuizamento correcto das situações implica que na aplicação lei dos homens se tenha em conta o bem supremo que é a defesa da vida humana e a sua dignidade, e que o infligir da letra das normas não significa infligir o espírito com que as mesmas foram constituídas em lei. Só a verdade permite fazer a distinção entre a letra e o espírito, entre a letra que mata e o espírito que dá vida.

Padre Júlio