DOUTRINA

O mistério da Incarnação não se operou pela mulher,

mas sim com a Mulher.

Não senhor, não é outro donativo. Trata-se, ainda, daquele mesmo de 50 contos de que nos temos ocupado. É para explanar.

Não se sabe quem, nem isso interessa, mas sabe-se que foi uma mulher. Uma portuguesa socialista cristã é que deu o dinheirinho. Ganhou o tipógrafo. Eles estão mais afeitos às letras do que eu. Pois é verdade. A notícia vem das mãos da própria Anónima. Vem a refilar. Começa assim: «Realmente acha que não há em Portugal portuguesas?»

Eu cá sou o derradeiro a desprestigiar a mulher. Dantes, quando andava pelas prisões, não sei que me dava no peito ao ouvir a voz dos carcereiros: «Ali são as mulheres!» E se os seus filhinhos estavam, como às vezes acontecia, pior. Mais dor no meu coração! Eu sou o derradeiro a desprestigiar. Quisera ver a mulher imune, cheia de privilégios, enobrecida, respeitada. Nós nascemos da mulher! Mais: O mistério da Incarnação não se operou pela mulher, mas sim com a Mulher. Isto são verdades. Mas tais coisas vejo e oiço pelas terras aonde passo, que se me afigura ter a mulher esquecido esta sua grandeza, ocupada como parece andar com as grandezazinhas que ela faz. Que elas fazem, sim. Ora ele está tudo feito. Basta-lhes viverem a sua dignidade.

Eis porque, senhora de Lisboa, eu não acreditei às primeiras e, no caso presente, coloquei o homem no lugar da mulher. Fica tudo agora esclarecido. Os quinze mil leitores deste número do «Famoso» ou «Famosíssimo», como já lhe querem chamar — os seus leitores, digo, fiquem sabendo agora, como eu também, que em Portugal há mulheres portuguesas.

Oiça lá!, quando vem por aí fora até Paço de Sousa? Diga, para eu estar — ouviu? Também quero ver como se apresentam as mulheres portuguesas.

Vêm cá tantas, tantas, tantas, das tais grandes, nascidas e criadas em Portugal, sim, mas a gente fica a duvidar se elas verdadeiramente amam Portugal, por não quererem ver que a desgraça destes meus filhos é feita, em parte, das suas grandezas!… Cá fico à sua espera

PAI AMÉRICO, Notas da Quinzena, 1.ª ed., 1986, pgs 169-170.