MALANJE

Entrou com seu irmão quando tinha apenas 9 anos. Passado um ano ficou muito doente até ao ponto de ter que o levar no hospital. Foi lá onde nos informaram que era falciforme (enfermidade de células que se deformam e reduzem seu tempo de vida). Este tipo de enfermidade é considerada hereditária e é muito comum em países africanos. Depois de detectar a doença nos apercebemos que uma das soluções urgentes quando estava doente era a transfusão de sangue. Um dos sintomas é a baixa hemoglobina e dor nos ossos.

O «Peixe frito» (apelido dado no Gaiato) cresceu com essa doença. Era um rapaz magrinho e sempre muito empenhado nos estudos. Algumas vezes as dores eram tão intensas que lhe aconselhamos suspender os estudos temporariamente; mas ele não aceitava e continuava. Toda uma lição de desempenho e força de vontade.

Com apenas 17 anos estava como responsável da área de fiscalização e supervisão no escritório. Agora se fazia chamar Paixão. Tudo indicava que seria um rapaz de sucesso académico e um grande coração. Tristemente e depois de dois paludismos consecutivos a família decidiu retirar-lo do Gaiato para sua recuperação. Passados três dias, na Sexta-Feira Santa os familiares o levaram para o hospital de manhã e nos informaram de noite que precisava de uma transfusão de sangue urgente. Nós fomos com dois rapazes para fazer a doação, mas ao chegarmos nos informaram que tinha falecido.

Assim o nosso Paixão nos deixou no mesmo dia da Paixão de Nosso Senhor à espera de uma simples transfusão de sangue. Fica como uma chamada de atenção para pensar e reflectir sobre a saúde pública, vital em qualquer país. Recursos materiais e profissionais devem ser uma prioridade absoluta na saúde, educação, alimentação… Caríssimo filho, Deus te recebeu nos seus braços, já terminaram as tuas dores e aumentaram um bocado as nossas, mas temos a certeza de que teu exemplo e tua memória nos acompanharão até nos reunirmos contigo.

Padre Rafael