MOÇAMBIQUE
É tempo de ajudar
Há uma canção cujo refrão diz: "é mais alegre dar que receber...". Desta vez o meu coração diz o contrário. Foi para mim uma grande alegria receber.
A nossa Casa está a ficar pequena. Todos os dias aparecem situações difíceis perante as quais é impossível dizer não. Muitas vezes são crianças que percorrem quilómetros a pé para pedir socorro, outras são deixadas na Aldeia mais próxima pelos vizinhos e amigos por saberem da existência da nossa Casa. Semanalmente, vamos por aí fora com algumas delas à procura de algum familiar para tentar conhecer a verdadeira história.
As nossas necessidades aumentam e as doações diminuem, pois o momento crítico em que Moçambique vive é desolador.
No mês passado tivemos apenas o mínimo para garantir os nossos compromissos. Começamos por sensibilizar a todos para mais austeridade quanto à alimentação, à energia, a água que actualmente temos que pagar. O garantir a manutenção desta linda Aldeia deixa-nos com o coração atribulado, mas aumenta a nossa confiança em Deus.
Os nossos rapazes quando vêm passar os fins-de-semana em Casa, costumam pedir algum apoio para as despesas necessárias e costumo responder: "filho, hoje é Domingo, vamos colocar o nosso cestinho no ofertório e esperar que de lá do altar venha algo". Eles fazem-no com muito carinho. Às vezes há resposta, às vezes não. E assim no nosso silêncio Deus vai abrindo os corações que nos ajudam a viver com dignidade, a dar direito - e respeito - a todas as vozes.
Os nossos visitantes ficam contentes quando chegam à nossa Casa, imaginando logo uma família perfeita. Mas, como em todas as famílias, é preciso deixar que o trigo e o joio cresçam juntos e com o tempo, sempre com o coração nas mãos, respeitar o interior de cada um até o momento da colheita.
Nesta sociedade onde os valores são colocados à prova, é necessária uma preparação constante para não confundir o mal com o bem.
No meio destas noites intranquilas a pensar no amanhã, aparecem os nossos amigos da Pipeline, que alegria! Não os conhecemos, não conhecem os nossos rapazes, mas sabem da existência desta Casa e todos os anos somos bem lembrados por eles. A nossa gratidão à Direcção desta empresa e a todos os colaboradores que, de certeza, no seu trabalho pensam e lutam por um Moçambique melhor.
Enfim, todos os dias nas nossas orações lembramo-nos dos nossos benfeitores e nas nossas reflexões com os rapazes falamos daqueles que não nos conhecem, mas que nos têm presente no seu coração bondoso.
A imagem bonita desta Casa incomoda algumas pessoas. Pensar nos mais pobres é para alguns oferecer o que resta e não o que deve. Fico incomodada quando ouço pessoas que, ficando pela aparência, chama-nos de "ricos". Somos "ricos" por termos uma Casa digna, crianças saudáveis, partilhando alegria e esperança com os que chegam. Posso dizer que neste aspecto somos verdadeiramente ricos. Mas isto não é o suficiente.
É preciso que haja corações bondosos, capazes de partilhar o que têm para que possamos - todos os dias! - manter esta chama acesa. Dar aos mais pobres condições dignas para construir o seu próprio futuro.
A todos os nossos amigos que deixam com carinho as suas ofertas, quer em espécie, quer em outros donativos, o nosso muito obrigado. Nesta Família tudo é bem aproveitado.
Quitéria Paciência Torres