PÃO DE VIDA
Da trasladação de Pai Américo
Continuando a carrear algumas notas para avivar o acontecimento da trasladação de Pai Américo, do cemitério junto à igreja do Salvador de Paço de Sousa para a Capela da Casa do Gaiato de Paço de Sousa, embora com algumas dificuldades burocráticas, de facto confirmou-se o dia agendado pela direcção da Obra da Rua para esses momentos dolorosos - 17 de Julho de 1961. De um artigo de fundo n´O Gaiato, da autoria de Padre Carlos, importa respigar alguns excertos. Eis o essencial:
«Foi como prevíramos: simples, familiar, sentida.
[...] A preparação do corpo, sábado anterior ao dia 17, deu lugar a duas noites de vigília. Todos os mais velhos passámos por junto à campa, hora a hora, a merecermos a graça de termos mais connosco o Pai. Não que ele nos tivesse abandonado alguma vez! O seu espírito sempre pairou sobre nós! Mas, carne como somos, gostamos de completar a presença com os restos da sua carne.
Junto ao Altar, onde mora Jesus - Vivo, permanecerá a «Semente morta» de que Deus quis servir-Se para gerar o Corpo que somos nós, os filhos da «Obra da Rua». Duas presenças infinitamente distantes, a segunda recebendo o seu sentido da primeira - mas ambas sugestivas e clarificadoras do mesmo fundamental Mistério: a Vida que vem pela morte.
Disséramos, ao anunciar a probabilidade da trasladação, que quem estivesse, estaria como amigo, sem outro título no caso, por muito que o ornassem. Assim foi: não convidámos ninguém. Nem avisámos, sequer, quase ninguém. Até à véspera, estivemos na incerteza, não da licença oficial, mas da sua publicação a tempo. Quem veio, veio porque quis, espontaneamente, fosse ministro ou povo humilde - e esta circunstância tornou indizivelmente saborosas as suas presenças e irmanou aquela multidão nos mesmos sentimentos.
Houve, porém, uma presença, igualmente, inesperada, de Alguém que não pode despir-se da sua condição que ela está-lhe gravada na alma para a eternidade. Foi o Prelado da Diocese onde a cerimónia decorreu, à qual está particularmente ligada a «Obra de Pai Américo».
Com o Prelado e nEle, era a Igreja que ali estava, sentindo com a família da «Obra da Rua». Presença singularmente honrosa e consoladora foi essa, para nós, que não desejámos outro testemunho do que o da Mãe Igreja, a quem servimos, presença significativa de mais um ande lá, como aquele que um dia Pai Américo ouviu da boca do Bispo que lhe deu o sacerdócio.
Mas não estavam ali, somente, os que enchiam com tanto aprumo e respeito, o adro da nossa Capela. Longe, na distância, muitos mais do que aqueles a vencerem pelo coração. Cartas, telegramas, esmolas, gente conhecida e desconhecida... - tantas manifestações de comunhão connosco! E quantos outros que se não pronunciaram, se terão associado àquela homenagem, quantos!...
Tivemos este dia como um de muitos dias grandes que o Senhor nos tem dado sem que de nós os mereçamos. Que Ele nos dê a suprema graça de lhe correspondermos.» [«Pai Américo - Trasladação», in O Gaiato, N.º 454, 5 Agosto 1961, p. 1 e 2; com fotos].
Padre Manuel Mendes