PÃO DE VIDA

Encontro de Pai Américo com Magdeleine de Jésus

Tendo conhecimento da vinda a Portugal de Magdeleine de Jésus e de um encontro significativo com Pai Américo na Aldeia dos Gaiatos - Casa do Gaiato de Paço de Sousa, verificámos que ocorreu de facto em 1955, pois Pai Américo escreveu um artigo a duas colunas no quinzenário da Obra da Rua, narrando tão ilustre visita, com alguns pormenores. Ora vejamos:

«Visitantes ilustres

Tínhamos sido avisados e estávamos à espera, tendo, contudo, perdido as esperanças, pelo declinar do dia. Nisto e quando não contávamos notou-se avenida acima um grupo estranho. À maneira que se aproximavam, viu-se de quem se tratava. Quatro senhoras ornadas de uma túnica, sandálias, cinto, na cabeça um lenço como as nossas camponesas e sobre o peito, duas tiras de pano faziam o sinal da cruz. Com elas e na mesma simplicidade, vinha também um homem.

Só pela idade se distinguia entre as quatro, a Fundadora das Fraternidades do padre Foucauld, pois é delas que se trata. Qual a razão de ser desta visita? Nada. Nada de especial. De passagem pela nossa terra, a Fundadora quis ver e sentir a Obra da Rua, e nada melhor para isso do que entrar numa aldeia de gaiatos. Conversámos demoradamente. Ambos dissemos das nossas experiências. Há pontos de semelhança na constituição da obra de cada um. Dir-se-ia que nos conhecíamos. Ela começou a trabalhar em 1939 e nós um ano depois. Convidei-as e aceitaram a ceia. Fiquei admirado ao saber que o Irmão ali presente era sacerdote. Ninguém o diria pela sua maneira de vestir! Pena tive que não tivessem pernoitado, só para o ver no altar na manhã seguinte. Teria sido o meu primeiro contacto com um padre trabalhador. Enquanto descíamos ao refeitório, pergunto-lhe se queria vinho branco ou tinto e ele responde: do que for melhor. Temos aqui o Evangelho. Sim e não, são as palavras. Tudo o mais é enredo. Quero do melhor.

O nosso padre engenheiro [Padre Carlos] não perdeu um momento; ele era todo, em tudo quanto escutava. Os ideais são perfeitamente irmãos. Elas, hoje, em 112 Fraternidades e nós, padres da rua, em nossas Casas do Gaiato, ambos realizamos Jesus.

Pio XII, ao que me disse a Fundadora, já chamou por ela dez vezes. Dez audiências. Que terá ele visto nesta Mulher - ele que tem mostrado ser empregado de escritório e industrial e jornalista e mineiro e condutor dos eléctricos e tipógrafo e cientista, pelos discursos que tem feito às classes e categorias; qual será o interesse em ter falado com a irmã Madalena e agora mais uma, pois que ela vai a caminho de Roma?! Estas Irmãs e este Irmãos não se dedicam a nenhuma obra especial. Não têm colégios. Não têm hospitais. Não cuidam de orfanatos. Não dão catequese. Não visitam pobres. Parece-nos que não deveriam um tal interesse ao Papa, a este Papa. E contudo ela tem estado muitas vezes e ora vai a caminho! É que chegou a hora. A Igreja teve sempre os seus homens, as suas obras, o seu tempo. Quando todos se confundem e tudo se vai a desmoronar, Ela aparece. Sou Eu! Eis as fraternidades do padre do Deserto, espalhadas por quatro continentes, servidas por todas as cores e classes. Basta viver Cristo sem cerimónias para ser cristão.

Oficinas, fábricas, campo; todas as artes, todas as profissões. Até nas cadeias! Se um ou outro escolhe ser recluso, vai por seis meses e é um preso na prisão sem nada que o distinga dos mais, a não ser o fogo interior que o levou ali. A Igreja, eterna e inesperada revolucionária! Ora este Papa que é tudo com todos, viu a chama... e chama.» [Visitantes Ilustres, in O Gaiato, Ano XII, 30 Julho 1955, N.º 298, p.4].

Padre Carlos Galamba, também admirador do carisma de Charles de Foucauld, no cinquentenário da chegada das Irmãzinhas de Jesus a Portugal, recordou vivências suas: «Foi com as Irmãzinhas que mais de perto convivemos, justamente porque a Curraleira era já nosso campo de acção. Mas um retiro com o Padre Voillaume e os seus escritos deixaram-nos calorosa marca.

Antes de construírem a casinha - albergue em Fátima, concebida um pouco ao sabor das do Património dos Pobres, a Irmã Madalena, fundadora delas, veio a Paço de Sousa e foi ainda Pai Américo que a recebeu. Depois, durante vários anos em que rapazes nossos chamados ao serviço militar tiveram a devoção de ir a pé a Fátima na peregrinação de Outubro, era nessa casa que encontravam acolhimento fraterno.

Em 1960, em Lourenço Marques, foi na palhota delas em Xipamanine que ocorreu o encontro mais significativo com os «Encanecidos», nome que Pai Américo dava aos seus companheiros de trabalho e de «República» nos tempos em que por lá andou. [...]» [O Gaiato, n. 1533, 14 Dez.
2002, 4].

Na verdade, tendo Pai Américo muito apreço pelas Irmãzinhas de Jesus, esteve empenhado na sua acção junto dos pobres, nomeadamente no Bairro da Curraleira, na periferia de Lisboa, como nos foi testemunhado pelas Irmãzinhas de Jesus, de Fátima.

No tempo que Deus nos vai dando pela sua infinita bondade, para gastarmos com os outros, conhecemos há vários anos o Bairro da Apelação, na Quinta da Fonte, nomeadamente por um rapaz desta comunidade, o António da Costa. As Irmãzinhas de Jesus foram marcando uma presença cristã nesse bairro, em Loures. Em Portugal, têm sido um sinal simples e luminoso de uma Igreja serva e pobre.

Depois de carrearmos alguns testemunhos comprovativos do interesse de Pai Américo pela vida e espiritualidade de Charles de Foucauld e das Irmãzinhas de Jesus, como corolário, é de sublinhar o encontro feliz com Magdleine de Jésus - também Venerável!

Padre Manuel Mendes