PÃO DE VIDA

Presépios de Jesus

Tudo quanto seja regresso a Nazaré é progresso social cristão.

Padre Américo

O Reino de Deus «é, acima de tudo, uma Pessoa com um rosto e um nome: Jesus de Nazaré, 'imagem do Deus invisível' (Cl 1, 15) [Papa João Paulo II — Redemptoris Missio, 7-XII-1990, n. 18 — Acta Apostolicae Sedis 83 (1991) 265]. Na verdade, Jesus — Deus salva — virou definitivamente uma página no tempo com a proximidade permanente de Deus, que inunda de graça o mundo — é a Boa Notícia da salvação, esperada e anunciada à humanidade, sendo reconhecida logo pelos humildes: «Quando os anjos se afastaram deles em direcção ao Céu, os pastores disseram uns aos outros: 'Vamos a Belém ver o que aconteceu e que o Senhor nos deu a conhecer'. Foram apressadamente e encontraram Maria, José e o Menino, deitado na manjedoura.» [Lc 2, 15-16]. Santo Agostinho notou: «In praesepio positus, cibus noster est factus — deitado numa manjedoura, torna-Se nosso alimento» [Sermo 189, 4].

Depois da sua viagem à Terra Santa, S. Francisco deteve-se nas grutas de Greccio, quando vinha de Roma, onde recebera do Papa Honório III a aprovação da sua Regra, em 29 de Novembro de 1223. Nessa pequena localidade a cerca de 90 quilómetros de Roma, quinze dias antes do Natal de 1223 e três anos antes de morrer, S. Francisco [1181†1226] — o Pobrezinho de Assis — chamou João, homem daquela terra, pedindo-lhe ajuda: «Quero representar o Menino nascido em Belém, para de algum modo ver com os olhos do corpo os incómodos que Ele padeceu pela falta das coisas necessárias a um recém-nascido, tendo sido reclinado na palha duma manjedoura, entre o boi e o burro» [Thomas Celano — Vita Prima, 84]. Assim, foi recriado o nascimento de Jesus com um Presépio [do latim praesepe — estábulo ou curral] numa gruta: «À vista da representação do Natal, as pessoas lá reunidas manifestaram uma alegria indescritível, como nunca tinham sentido antes. Depois o sacerdote celebrou solenemente a Eucaristia sobre a manjedoura, mostrando também deste modo a ligação que existe entre a Encarnação do Filho de Deus e a Eucaristia. Em Greccio, naquela ocasião, não havia figuras; o Presépio foi formado e vivido pelos que estavam presentes. Assim nasce a nossa tradição […].» [Papa Francisco — Admirabile Signum, 1-XII-2019, n.2 — AAS 91 (2019) 1840; Vita Prima, 85].

Foi uma apresentação concreta e simples da grandeza do amor de Deus na fragilidade de uma criança: o Menino Jesus, pois Deus fez-Se pequeno, deitado numa manjedoura de animais. As pessoas reunidas aprofundaram assim o mistério da Encarnação de forma viva e inspiradora; e «todos voltaram para suas casas cheios de inefável alegria.» [Vita Prima, 86]. Facilitou, assim, a compreensão do nascimento de Jesus — o Salvador, pelo que realizou uma grande obra de evangelização.

Com a Carta Apostólica O Sinal Admirável, o Papa Francisco quis «apoiar a tradição bonita das nossas famílias prepararem o Presépio, nos dias que antecedem o Natal, e também o costume de o armarem nos lugares de trabalho, nas escolas, nos hospitais, nos estabelecimentos prisionais, nas praças…» [Admirabile Signum, n. 1 — AAS 91, 1839]. Neste Natal de 2023, esta belíssima tradição cristã natalícia completa 800 anos de existência!

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O Padre Américo, sendo fortemente marcado pelo carisma franciscano, incentivou muito a realização de Presépios nas várias Casas, pelo Natal do Senhor. Neste 8.º centenário do Presépio franciscano, vale bem a pena meditar numa encantadora página de antologia, com Teologia infantil — ligando o Natal ao Mistério Pascal, escrita pela sua pena original na Casa do Gaiato de Paço de Sousa e recordando o berço da Obra da Rua. Eis:

O PRESÉPIO

É muito frequente surpreender grupos dos nossos pequenos empoleirados no presépio, extasiados. Ao perguntar-lhes do que mais gostam, ainda não encontrei quem me dissesse coisa diferente. É do Menino Jesus.

— Mas ouve lá; e aquelas coisas tão lindas — não gostas?

— É do Menino Jesus!

De uma vez, na Casa de Miranda, entrei no quarto e fui dar com o Rui, de 3 anos de idade, sobre o meu leito, a examinar muito de perto um crucifixo pendente das guardas da cama.

— Que estás aí a fazer Rui?

— É Jesus.

— Mas como é que vieste para aqui, Rui?

E não dizia mais nada, o pequenino enamorado. Assim, estes de Paço de Sousa, à beira do nosso Presépio.

Mas isto é uma coisa natural.

Dai à criança o que ela precisa, que bem depressa começa a amar.

Ela conhece a ordem, por intuição. Desordenada por natureza, neste capítulo, põe as coisas no seu lugar. Deus ocupa o primeiro.

«Mas então, não gostas dos camelos, das lâmpadas de cor, do moinho de vento?

— Gosto do Menino Jesus!»

Senhor dos Céus, ele é tudo tão simples e os mestres encartolados fazem tudo tão difícil, para segurar as cartolas.» [O Gaiato, N.º 23, 7 Janeiro 1945, p. 1.].

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Oito décadas depois, a tradição salutar e transcendente do Presépio continua viva e reforçada nesta Casa do Gaiato, sendo centro de atenções na preparação para a vinda do Menino Deus. De facto, nomeadamente no refeitório, em cada Advento, os Presépios — com as imagens da família de Nazaré e muitas outras características e de feição popular que os enriquecem — são o foco principal desta comunidade cristã, que celebra na Eucaristia com alegria a vinda do Menino Jesus ao mundo flagelado pelo pecado.

Neste Natal de 2023, em que o mundo está extremamente dilacerado por muitos padecimentos (fome, doenças, etc.) e guerras terríveis (v.g., Ucrânia, Palestina e Israel, em África) — as festividades natalícias serão muito mais tristes, pois tem havido um crescendo de dores pelo mundo e que fazem chorar muitas vítimas inocentes, enfermos, desanimados, sem amparo e injustiçados. Na sua tarimba, Pai Américo testemunhou muitas tristezas em rostos sem esperança, como sublinhou: «Nada há mais triste no mundo do que uma criança triste.» [O Gaiato, N.º 116, 7 Agosto 1948, p. 3.].

Neste tempo tão lindo, que na Igreja é vivido com muita intensidade, apelando ao amor e à paz, especialmente as pessoas em sofrimento esperam a nossa proximidade — na amizade, na partilha e na oração — que as façam sentir que são amadas por Deus e salvas em Cristo. Feliz Natal de Jesus — o Menino da manjedoura e da Cruz — junto à lareira com o Presépio e em família, onde viemos à luz para seguir a estrela de Belém — a verdadeira Luz!

Padre Manuel Mendes