PÃO DE VIDA
Uma carta de anúncio d'O GAIATO
Há 80 anos, precisamente no dia 5 de Março de 1944, tempo da terrível II Guerra Mundial, cujas consequências muito catastróficas também atingiram Portugal, fazendo aumentar as misérias, nomeadamente as carências alimentares e a orfandade, entre outras, nasceu um quinzenário católico, de seu nome O GAIATO — depois apelidado de famoso - na imprensa periódica nacional, fundado pelo Padre Américo Monteiro de Aguiar - um gigante da caridade e profeta - como bandeira da Obra da Rua, cujo título não era inédito, mas desta vez de cariz revolucionário. Na verdade, foi pondo o dedo nas feridas sociais, à procura de alguns remédios possíveis. E veio a ser bem acolhido pelos seus amigos, crentes e descrentes, leitores — devoradores, sendo uma novidade simples e de esperança naquelas horas sombrias, pois era dedicado aos Pobres. Na sequência da sua colaboração nos jornais Correio de Coimbra e A Ordem — continuou a revelar uma pena de artista da palavra — um grande jornalista e escritor português cristão do século XX. Bem-vindas também as colunas de colaboradores das várias Casas — nomeadamente padres diocesanos ao serviço da Obra da Rua e filhos — rapazes…
Faz algum sentido neste feliz aniversário — dois carros de milho, como diz o povo - dar à estampa uma cartinha manuscrita e inédita de Pai Américo, de anúncio deste estimado jornal eclesial, cujo bem que vem semeando desde o princípio só Deus sabe. Foi recolhida, por gentileza da Dra. Maria Antónia Silva [bem-haja!], do Fundo da Biblioteca Municipal de Paredes, sendo proveniente da Biblioteca de Monsenhor Moreira das Neves, cedida pela Paróquia do Sagrado Coração de Jesus, em Lisboa, Ora eis esta prenda a propósito, redigida na sua caligrafia inglesa e despachada:
«Miranda [do Corvo]
16/2/44
Meu caro Padre Moreira das Neves
Ora olha; vai sair brevemente — "O Gaiato", quinzenário vendido nas ruas do Porto aos Domingos de tarde. E também em Coimbra, por gaiatos de M.da. E também em Lisboa, pelos vossos ardinas, sendo para a Casa do Ardina a comissão do estilo. O jornal custa dez tostões. Dê as suas ordens [discreta.te?] para o Manuel Pacheco, da "A Ordem", que é quem faz tudo. Eu faço o jornal. Ele pensa em publicar 5000 exemplares no 1.º número. Seria um lucro para a Ressano Garcia. Escreva já! Eu já tenho todo o material. Terça-feira próxima entrego e a seguir sai.
Ainda não me disse nada da carta do suposto rapaz; já cá tenho outra.
Seu m.to amigo in C. J.
P. Américo!
Escreva para P. [Paço] de Sousa, o que disser ao Pacheco.».
Ainda deixamos breves notas complementares. Assim, a missiva é escrita da casa-mãe da Obra da Rua. E dirigida ao Padre Francisco Moreira das Neves, que nasceu a 18-XI-1906, em Gandra — Paredes, foi ordenado Presbítero - em 25-V-1929, no Porto, Pároco de Milhundos — Penafiel e Mosteiró — Vila do Conde, escritor de escritores inquietos e se destacou como grande poeta do povo e jornalista [especialmente no jornal Novidades, em Lisboa], Cantor de Nosso Senhor, Poeta da Eucaristia [do epitáfio, na terra natal], tendo falecido em 31-III-1992. Com Maria Luísa Frederica Meneses Moreira Ressano Garcia [24-I-1912, Lx.ª † 3-XI-1972], fundaram a Obra do Ardina e o seu jornal, para a protecção dos ardinas de Lisboa. O jornal O Gaiato começou por ser impresso na Tipografia da Casa Nun`Álvares, da firma António Pacheco & Filhos, à Rua Santa Catarina, no Porto, onde era impresso o jornal A Ordem, desde 8-V-1915. A seu tempo, daremos notícia de outros manuscritos, sobre Padre Américo, do citado Fundo paredense. Com boa idade e maturidade -oito décadas, Deus queira que O Gaiato seja sempre prenhe de palavras novas da Palavra de Deus para os famintos de caridade e justiça. Muitos parabéns e ad multos annos!
Padre Manuel Mendes