PÃO DE VIDA
Das campainhas
Neste centenário dos acontecimentos de Fátima, a caminho da celebração da Páscoa da ressurreição de Jesus, em que ecoa o tilintar das campainhas do anúncio pascal, pois Cristo venceu o pecado e a morte, fará algum sentido continuarmos com um contributo rudimentar sobre a devoção mariana, juntando algumas notas de risco americano (do Padre Américo...).
É oportuno, pois, chamar aqui um inciso de Padre Américo que, no seu jeito característico de artista da palavra, registou em Outubro de 1949 uma nota pitoresca e de rico significado mariano na vida de uma comunidade em que viveu e a que presidiu: Ontem na capela [da Casa do Gaiato de Paço de Sousa] e à oração da noite, por pouco que não havia uma grande bulha. É a campainha. A campainha que cinco vezes dá sinal no fim de cada mistério do terço./ Eu acho isto o movimento mais gracioso e mais natural da nossa casa, porquanto, todos nós, em pequenos, nos recordamos de ter feito na mesma, se na verdade tivemos a feliz oportunidade de tocar sinos, sinetas, ou campainhas.
Este belo fio entretece-se com esta ponta da meada: Quando eu era pequenino, rezava-se em família, pelos que andam sobre as águas do mar. A propósito, marcou-o muito o afundamento, em 15 de Abril de 1912, do Titanic, no Atlântico Norte, pois o barco onde viajava da Beira (Moçambique) para Portugal, de férias, recebeu um SOS desse paquete de luxo.
No Colégio vicentino de Santa Quitéria, em Felgueiras, com 12 anos, Américo de Aguiar foi admitido como aspirante dos Filhos de Maria, a 8 de Dezembro de 1899; e recebeu a fita dos Filhos de Maria a 2 de Fevereiro de 1900.
A sua vida de piedade mariana continuou a ser testemunhada na adolescência. Aos 15 anos, em Julho de 1903, enquanto marçano de uma loja de ferragens, na cidade do Porto, numa missiva ao seu irmão mais velho Padre José, ora em Cochim, escreveu: Vamos a todos os exercícios religiosos como o mês de Maria. Américo de Aguiar participava nas celebrações na Igreja de S. Lourenço, do Seminário Maior de Nossa Senhora da Conceição. Mais, em Junho de 1904, noutra carta para o mesmo sacerdote, refere ainda: Agradeço-lhe os conselhos que me deu com respeito à devoção a Maria Santíssima.
Treze anos depois (1917), em horas trágicas da história e sob os efeitos das medidas persecutórias contra a Igreja, Fátima foi-se tornando um grande centro de peregrinações, atraídas pelos testemunhos de três crianças baptizadas; embora só em Outubro de 1930 tenha sido autorizado oficialmente o seu culto. Pode dizer-se ainda que este fenómeno e problemática superam em muito esses acontecimentos, cuja complexidade se comprova pelas múltiplas abordagens possíveis e investigações em curso, mais serenas actualmente, mesmo debaixo de fogo.
Nesta matéria, seguramente, ensina-nos o II Concílio do Vaticano, na Constituição Dogmática Dei Verbum (n.4), que não se há-de esperar outra revelação pública antes da gloriosa manifestação de Nosso Senhor Jesus Cristo. E no Catecismo da Igreja Católica (n.67), vem expressamente: No decurso dos séculos tem havido revelações ditas privadas, algumas das quais foram reconhecidas pela autoridade da Igreja. Todavia não pertencem ao depósito da fé. O seu papel não é aperfeiçoar ou completar a Revelação definitiva de Cristo, mas ajudar a vivê-la mais plenamente numa época da história. O Cardeal Ângelo Sodano, em 15 de Março, afirmou que há uma mensagem de esperança que chega até nós a partir da celebração do centenário das aparições de Maria Santíssima em Fátima.
A talho de foice, a dinâmica comunidade cristã de S. José, em Coimbra, tão próxima e que tem acolhido iniciativas celebrativas sobre Padre Américo e em especial o Dia do Gaiato, neste ano centrou as interessantes conferências quaresmais nos Cem anos de Fátima, com a tónica na Graça e Misericórdia da sua mensagem, como síntese deste grande acontecimento eclesial, cujo significado deve ser conhecido e melhor compreendido.
É justo assinalar aqui que, na véspera de S. José, depois do nosso último encontro e antes do seu aniversário natalício (14 de Maio), Monsenhor Doutor José Geraldes Freire baixou à poeira gloriosa, aos nossos olhos e preces, com elogio académico, na Conchada, em Coimbra. Foi um grande vulto da Igreja e das Letras, mestre incansável e com a sua pena de latinista exímio e fatimologista.
Pai Américo passou diariamente as contas do Rosário com tanta devoção desde o regaço de sua mãe até ao dia da Senhora do Carmo. Esta oração simples à Mãe de Deus com certeza também ajuda os seus filhos no Caminho do Céu!
Veremos, ainda, alguns sinais do vento que soprou em Fátima, em Maio de 1952, pois falou das suas experiências do Pobre, de forma extraordinária.
Padre Manuel Mendes