PATRIMÓNIO DOS POBRES
A pobre mãe vivia desorientada por causa do seu filho de 19 anos, sem querer trabalhar nem estudar, preferir a vida da rua e ela não ter condições de habitabilidade para resguardar as irmãs, também filhas dela, daquele jovem preguiçoso sem convivência fraterna com as raparigas.
A casa onde vivia, na Amadora, era uma reduzida baiuca arrendada por 400€ mês, um espaço para tanta gente dormir!... Que fazer?
Veio chorar para junto de mim a sua triste sorte e dos seus filhos, sobretudo das suas meninas. Ela que teve uma adolescência atribulada, com o nascimento daquele filho, o qual veio pequeno para o meu convívio, na Casa do Gaiato, enquanto ela trazida de África, para os arredores de Lisboa, passou por tudo. Aprendeu a ler e a escrever, entregou-se ao trabalho e hoje, sabe dar valor à vida. Juntou-se com alguém, também africano, com o qual gerou família.
O seu grande problema, era agora, a casa, as filhas e o filho. Ela tem um medo terrível que o rapaz não respeite as irmãs.
Havia do lado do Sul do Tejo, uma casa à venda por 95.000€. É uma habitação com largueza de quartos para a sua família e podia ser que o Jovânio se endireitasse.
Era um sonho que ela punha na minha frente e me fazia também empreender. Uma casa!... Uma casinha!... Há quanto tempo eu grito e as autoridades arranjam dinheiro para tudo, menos para casas. Aumentam as rendas, sobem os preços, mas casas!... Mas casas!... Nada.
Rendi-me e passei-lhe um cheque de 7.500€ com que ela pagou a promessa de compra e venda. O negócio esteve demorado, porque a banca pôs-lhe reservas, por não saber de onde lhe vinha o dinheiro.
Na escritura acrescentei um cheque de 24.000€ e paguei os impostos: setecentos e muitos euros.
O sonho da Iasmina tornou-se realidade. Tem um andar largo, para viver com quartos suficientes para resguardar as filhas, dar comodidade e animar o Jovânio e pagar à banca apenas 190€ mês.
No cartório aonde fizemos a escritura, o delegado do dono da casa, apresentou-se como muçulmano e ficou pasmado, ao ver um padre católico a ajudar, tão substancialmente, uma família pobre. Ele nunca pensou, que na Igreja dos católicos houvesse gente assim.
- Há sim senhor! Há sim senhor! Este dinheiro não é meu, é dos cristãos que vivem a sério a sua Fé, que manda amar a Deus, os pobres, gritar por Justiça, mesmo com o sacrifício das suas economias.
É um movimento chamado Património dos Pobres, da Obra do Pai Américo, que dá a mão, actualmente, a muitas centenas de desamparados, como esta sua conterrânea que vê sentada a seu lado.
É a força do Bem. É sede de justiça! É a palavra de Isaías: - Reparte o teu pão com o faminto, dá pousada aos pobres sem abrigo, leva roupa a quem vires andar despido e não voltes as costas ao teu semelhante. Então, a tua Luz despontará como a Aurora, a tua Justiça andará à tua frente e atrás de ti a Glória do Senhor.
É a experiência viva das boas obras, é a sua Luz que tem a força de causar estremecimento aos que vivem na escuridão do dinheiro.
A Iasmina olhava-me felicíssima! De cor retintamente negra, os seus olhos raiavam alívio, alegria e esperança!
- Padre posso dar-lhe um abraço?
- Podes mulher, podes dar-me um abraço e um beijo!
Como foi bom aquele momento! Acarinhei aquela mãe negra e partilhámos a nossa felicidade. Ela por receber e eu por dar.
Dizia o muçulmano que a pessoa que ele representava, era um homem rico com 15 filhos e 4 mulheres. Atrevi-me a fazer-lhe uma pergunta: - Vocês lá no Irão, matam as mulheres e obrigam-nas a uma subjugação humanamente repugnante! Que me diz a isso?
O homem atrapalhou-se e disparou: - Em todas as religiões há do bom e do mau!...
Eu calei-me, mas a Luz ficou lá. Ninguém, nem Deus apagará o brilho das boas obras.
Padre Acílio