PATRIMÓNIO DOS POBRES
Escrevo-te Amigo Leitor na semana da Paixão, Tempo que nos lembra quanto o Filho de Deus sofreu por nós.
A realidade é sempre a Dele agarrado à sua Cruz, imagem permanente e viva de quem sofre neste mundo.
Era por cerca do meio-dia e uma voz muito fininha falava-me pelo telefone:
— É fulano? — Sou sim. — Então já acordaste? — Foi mesmo agora. E a pessoa a quem desejava falar primeiramente era a si. — Estou muito fraquinha, mas já acordei. — Então filha, isso há-de ir devagarinho.
Era uma própria mãe de 21 anos, operada duas vezes a quistos nos ovários, com intervalo de pouco mais de um mês, a qual apanhou uma bactéria hospitalar que se alojou no estômago e destruiu o tratamento destinado a acabar com os quistos. O hospital particular, tentou mandá-la mesmo assim, para fora. Quando um clínico a alertou para o perigo dela morrer.
Corajosa, exigiu o livro de reclamações… e as coisas mudaram de figura. Iriam fazer-lhe uma medicação a fim de eliminar o parasita alojado no estômago. Sendo necessário pô-la a dormir e pagar 5.000,00€. Ora o Património já lhe havia dado para a primeira cirurgia 5.500,00€ e para a segunda 3.000,00€. E para eliminar os quistos, 2.500,00€. Agora sem dinheiro que havia de fazer? Pela Providência, um amigo idoso com o seu filho, pela Páscoa e pelo Natal, costumam dar-me 2.000,00€ como ajuda e estipêndio para celebrar pelos seus.
Era segunda-feira, veio com um envelope de vinte notas de 100,00€! Telefonei à doente dando-lhe a novidade que já tinha 2.000,00€, mas mesmo assim o hospital não adiantou. Então agarrei no telefone e falei com vários benfeitores que se me oferecem: — Veja lá quando se vir aflito não faça cerimónias. E vieram logo cinco mil e tal euros que me deram para arranjar os 3.000,00€ que me faltavam para o hospital e mais 2.350,00€ para aquela que tem sido operada na Clínica do Pulmão em Cascais. Instintivamente elevei as mãos para o Céu, agradecendo ao Pai que vela pelos pobres e doentes.
Quando tenho, dou, quando me falta, choro e rezo.
É o que me acontece agora com aquela desditosa, que já me telefonou várias vezes, em dias seguidos, a pedir que lhe dê 600,00€ para um curativo do seu joelho. Caiu na escada da sua casa de joelhos e partiu a rótula do esquerdo.
O hospital público não tinha cirurgião; teve de se socorrer do particular com 6.000,00€. O Património deu-lhe 500,00€. A operação não resultou, voltou ao serviço público o qual não a atendeu por ter sido intervencionada no particular. Paguei-lhe a segunda cirurgia por 1.500,00€. Agora insiste em pedir 600,00€ para novo tratamento, mas eu não tenho com que lhe valer. À vista de tanta pobreza e tanta doença como aprecio o Serviço Nacional de Saúde (SNS)!... Sem este a funcionar o que se será dos doentes pobres ou dos pobres doentes? Parece estarmos num país do submundo, onde as pessoas que adoecem despertam logo um triste choro à sua volta, porque vão morrer.
Também me parece que há Serviços de Saúde Privados que fazem negócio com as doenças e os desastres dos enfermos.
Num mundo dominado pelo dinheiro não admira que se faça render o peixe; que seja preciso fazer cirurgias seguidas aos mesmos órgãos, acompanhados de consultas, tratamentos e medicação bastante dispendiosas; que um governo cesse o seu mandato com elogios à abundância do próprio cofre, quando nos deixou nesta situação calamitosa para os pobres.
Espero que os novos governantes abram os olhos e o coração e não entreguem a saúde, a habitação e o ensino aos privados, excluindo desta forma os mais pobres. E que esta Páscoa desperte em todos, mas sobretudo nos cristãos a certeza da Eternidade, a decrepitude das ilusões deste mundo e a força das Boas Obras para todos sermos mais felizes.
Padre Acílio