SINAIS

Está a chegar a Páscoa. Da minha memória batem, saltam porta fora as recordações mais antigas. Estou sentado à lareira, no refeitório da Casa do Gaiato de Beire. Os gatinhos acariciam-me os sapatos e miam. A Semana Santa, este ano, veio com chuva e frio. Em Picote celebrávamos também a Paixão, a Morte e a Ressurreição de Jesus. Às cerimónias na capela, pequena nesses dias, segui o curso ainda antes da renovação litúrgica. O compasso já era uma festa. A cruz decorada com flores bancas. Eu com a minha sobrepeliz branca também sobre a batina preta. Uma linda estola bordada finamente. A campainha soava forte por aqueles fraguedos. A água da caldeirinha mandei que fossem buscá-la directamente ao Douro. Obedeceram santamente. Eu abençoei-a. Uma equipa de homens e crianças percorria as ruas do bairro dos trabalhadores e dos engenheiros. Todos abriam a porta ao Senhor Ressuscitado. Um beijinho na cruz e votos de um dia feliz. Era o refrão. Na saída vínhamos carregados com ovos. Que guardávamos num grande cestinho. Nos dias seguintes seriam entregues às famílias mais pobres. Era a forma de Jesus estar com eles também. Tudo simples e belo. Não havia foguetes. Apenas a dinamite a rasgar os túneis, a grandes explosões. A criação abalada pelo acontecimento da ressurreição do filho de Deus. Lá, na entranha da terra, os marteleiros pontuavam. Para alguns foi um sepulcro. No final do dia, habitualmente aquecido pelo sol primaveril, eu senti-me cansado. Humanamente cansado. Mas feliz. Ainda passava na capelinha para visitar o Cristo da nossa fé. E adormecia a olhar as estrelas. Assim foram tantas Páscoas. E agora Senhor? A minha Páscoa é no nosso Calvário. Com os teus doentes.

Tenho sempre preguiça para escrever. Desta vez o Senhor Padre Alfredo começou a ditar. Assim saíram os nossos sinais. Quando lerdes já a Páscoa passou — mas ela está sempre viva no nosso coração…

Que Ele, o nosso Jesus, dê luz aos nossos passos nos nossos caminhos.

Padre Telmo